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Indesejada metamorfose

Por Lucas

Aos 18, me formaria no Ensino Médio. Na faculdade, aos 23. Mestrado e Doutorado. Filhos aos 30. Uma vida toda escrita em linhas retas de um caderno qualquer, como uma fórmula ou uma redação. Como se a vida fosse simplesmente realizar. Eu tinha toda a minha vida planejada. Sempre sonhei com os mínimos detalhes daquilo […]

Aos 18, me formaria no Ensino Médio. Na faculdade, aos 23. Mestrado e Doutorado. Filhos aos 30. Uma vida toda escrita em linhas retas de um caderno qualquer, como uma fórmula ou uma redação. Como se a vida fosse simplesmente realizar.

Eu tinha toda a minha vida planejada. Sempre sonhei com os mínimos detalhes daquilo que eu ainda viveria. Claro que, como ainda jovem, tinha minhas dúvidas quanto a que curso eu iria fazer. Mas eram poucas as opções. Eu sempre estive muito bem alinhado com as minhas próprias expectativas. Ou eu seria um engenheiro aeroespacial ou então um diplomata. Era tudo tão simples. Eu fazia tudo parecer tão simples.

Eu queria mudar o mundo. Queria ser relevante. Eu tinha certeza que eu ainda o seria.

Eu era alguém em ascensão. Com vida exalando pelos pulmões. Até que eu deixei de ser.

O aluno exemplar, o prodígio, todos títulos que um dia fizeram sentido, mas que não se impuseram por muito tempo. Veio a pandemia e como em um choque de realidade, todo o mundo idealizado desmoronou.

As aulas, online, tinham se tornado toscas e sem sentido. A vida moldou-se em monotonia. Aos poucos, os pulmões que eram cheios de vida, transformaram-se em suspiros de desespero. A ansiedade havia me corroído.

Não sei dizer ao certo quando eu abandonei aquilo que eu sonhava em ser. Talvez, antes mesmo desse maldito vírus sequer vir à existência, a fagulha de mudança já estivesse brilhando em mim. Mas isso, pode ser que eu nunca descubra com exatidão.

O que sei é que aquele que se gabava por ter sua vida toda definida em detalhes e cores, passou a chorar de angústia e desespero por viver em um mundo cinza e vazio.

As opções, que antes eram poucas e seletas, tornaram-se tão amplas e escapistas que minha identidade se esvaiu. Vi-me fazendo terapia para tentar concertar a manifestação de rebeldia que minha mente havia se tornado. Sem sucesso. Nunca fui bom em me abrir.

Aos poucos, aprendi que não pensar era a solução. Se eu abstraísse, não teria com o que me preocupar. Logo, iludi-me, dizendo que uma hora a resposta magicamente apareceria. Mas ela nunca apareceu.

Desde então, frustrei-me algumas vezes. Metamorfoseei-me outras tantas. Afinal, acho que sempre estive destinado a ser uma metamorfose ambulante, apenas esperando o casulo romper.

O aluno exemplar, ignorou os estudos.

O prodígio, já não tem perspectivas de um futuro brilhante.

A criança sonhadora, agora somente sonha com o dia em que saberá quem é.

Comentários

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Letícia 15/11/22

O início me chamou a atenção.. e achei incrível até o fim, que texto maravilhoso! Parabéns.

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